Passar de ano é sinônimo de aprender?
Por Jussára C Godinho
Nem
sempre aprendeu quem passou de ano.
Estudar com o objetivo apenas de passar não promove aprendizagem. Para
aprender de verdade, construir conhecimentos é necessário querer aprender e
para isso é preciso interesse, concentração, atenção e muita dedicação aos
estudos. Mas nem todos pensam e agem assim.
Estão aí as médias dos
concursos vestibulares e outros tantos concursos, ENEM, SAERS, Provinha Brasil,
comprovando que muitos estudantes - alguns já com diploma de ensino fundamental
e médio - não sabem ler, nem compreender textos simples, como uma crônica de
jornal, uma charge, uma tira, por exemplo; ou compreender as operações básicas
da matemática. Escrever, então, nem se fala, não escrevem com lógica e
coerência, muito menos com correção gramatical. Seus vocabulários são pobres,
não utilizam, nem na fala e nem na escrita, recursos discursivos mais
elaborados, não produzem discursos orais e escritos adequados, conforme as
normas e regras da linguagem culta, na maioria das vezes, não conseguindo
comunicar seus pensamentos e posicionamentos sobre os diversos assuntos do
mundo que os cercam.
Esses alunos são aqueles tantos,
espalhados nas salas de aula, que não levam os estudos a sério, e por isso não
seguem orientações dadas pelos professores, não fazem as atividades propostas,
não participam. Costumam estudar apenas para fazer provas, então, decoram os
conteúdos que vão “cair” nelas, ou dão um jeitinho de “colar”, indo, muitas
vezes, até razoavelmente bem, mas sem saberem efetivamente os conteúdos
trabalhados, isto é, sem aprender de verdade. Assim, nas ocasiões em que têm de
demonstrar o que conhecem, não conseguem, porque não se pode externar o que não
se tem.
A fim de que haja
aprendizagem, na verdadeira acepção da palavra, é necessário empenho, vontade,
dedicação, e um desejo ardente de aprender, mas isso implica estar disponível
para arcar com as responsabilidades advindas de sua construção. E o jovem de
hoje não tem tempo, está sobrecarregado de alternativas que competem com essa
disponibilidade: videogame, internet, celular, MP1,2,3,4,5,6,... Tudo muito mal
administrado.
O conhecimento, o aprender parece
que perderam seus lugares de honra na escola, tudo é mais importante do que eles.
Os alunos gostam da escola, porque é lá que fazem amizades, encontram os
colegas, acontecem suas primeiras paqueras, brincam, jogam, mas no momento em
que são confrontados com o conhecimento, e com a responsabilidade de aprender, daí
o caldo engrossa: eles reclamam, resmungam, fazem corpo mole, demonstram total
falta de interesse, como se estudar fosse um fardo que não estão dispostos a
carregar. Por isso, não se dispõem a fazer o que é preciso para interagir com
os conteúdos e aprender. Eles não fazem nada do que é solicitado pelo professor
e que é requisito para a aprendizagem, como atividades extraclasses, pesquisas,
leituras, estabelecimento de relações entre o que é aprendido em aula e os
acontecimentos do cotidiano, etc. E as lacunas advindas dessa atitude são
letais para a aprendizagem.
Dessa forma, prestem atenção no que tenho a
dizer: Quem realmente quiser aprender precisa se conscientizar de que, para
isso, é fundamental fazer todas as atividades propostas pela escola, principalmente,
ler, compreender, interpretar, comparar, analisar e produzir textos, pois, somente
assim será possível conviver, interagir com os conhecimentos e construir os seus
próprios. Quem constrói os seus conhecimentos garante a companhia deles para
sempre e não somente no dia em que será realizada a prova. Estudar apenas para
realizar prova é sustentar o “faz de conta” que é o estudo para muitos
frequentadores da escola, que têm como objetivo apenas “passar de ano”.
Escola, professores,
famílias! Urge conscientizar essa gurizada de que não basta passar, é
necessário aprender. E, ainda mais, não basta aprender, é imprescindível levar as
aprendizagens para aplicar na resolução dos problemas e das dificuldades do dia
a dia, no trabalho, na vida. É preciso aprender a pensar! Somente assim, estará
garantida a aprendizagem, e a escola e o aprender farão sentido e terão significado.
E as provas? Essas também estarão garantidas, pois seus resultados são apenas
consequência do aprendizado.
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Mágico despertar de Primavera
Jussára C Godinho
Primeiros dias de setembro! Abro minha
janela. Doce manhã de sol! Quase ouço o sussurrar do frio despedindo-se
sorrateiro.
No ar, o aroma adocicado
das alucinantes pétalas coloridas. Inspiro... Expiro... Inspiro outra vez... O
azul do céu invade meu dia, que mal começa a raiar, e inunda minh’alma de luz e
de alegria.
Milhares de gotas
brilhantes escorregam pelo meu corpo, num banho refrescante e delicioso de
Primavera. E me transportam imediatamente
para o mar. Chego a sentir o gosto forte do sal e o calor dos raios do
sol, dourando minha pele. Sonho, viajo, devaneio...
Afagada pela toalha macia,
volto e, debruçada outra vez na janela, contemplo os jardins vizinhos. Tudo
parece mágico. A brisa move lentamente as folhas que bailam, querendo viver.
O aroma permanece no ar. E
a alegria toma conta do meu ser.
O cheiro quente do café me
parece mais forte e mais gostoso. O pãozinho matinal, mais crocante do que
nunca. Seu miolo abre-se para receber a
manteiga sem nenhuma resistência. Nas entrelinhas do suco, sinto estampadas as
flores brancas e perfumadas das laranjeiras.
Há, em tudo, promessas de
uma nova estação, esperanças de renovação! É a vida brotando bem devagar... Chegando
quase sem avisar...
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Um dia na minha vida de professora
A Força da Poesia
Acordo
cedinho, seguindo aquela mesma rotina de todos os dias. Tomo meu chá, peço a
Deus para abençoar meu dia, mando luz em pensamento a todos os meus afetos (e
até a alguns desafetos), pego minha pasta gigantesca de materiais, hoje,
especialmente com uma caixa de prendedores de roupa, e saio para cumprir a minha
missão de ensinar.
Aprendo tanto, observando
o processo de aprender e ensinar que, às vezes, chego a ter a impressão de que
ganho mais do que proporciono conhecimento, pois aprendo a conhecer a alma do
ser humano.
Lá
vai um desses momentos de aprendizagem, no qual pude fazer algumas
constatações.
Júlio
é um menino de aproximadamente treze anos de idade, nasceu e vive na periferia
da cidade, está repetindo a série, tem poucos cadernos e nem sempre os traz
consigo, pois o “me esqueci, professora” o acompanha diariamente. Nunca cumpre
com suas obrigações escolares: não faz tarefas de casa, não participa das
aulas, tem atitudes inadequadas com colegas. É tão inseguro que necessita
chamar a atenção de todos, a todo momento, e para isso levanta e passeia pela
sala de aula, ri alto, brinca e conversa sobre assuntos totalmente fora de
contexto. Dessa forma, prejudica o andamento das aulas, a aprendizagem da turma
e o clima do ambiente. Júlio é assim sempre, é desinteressado, desestimulado.
Neste
mês, teremos aulas de Poesia. Vamos permitir que a Poesia invada nossos
corações e passeie dentro de nós, como se fosse sangue pulsando em nossas
veias.
Nosso
grande tema é a Natureza, ainda bela, esperando por nossa ajuda.
Lemos, comentamos, comparamos,
brincamos com os poemas, recitamos, apresentamos jograis, até que chegou o
grande momento: vamos produzir!
“Eu
não sei, professora”, diz um no fundo da sala. “Eu nunca fiz isso”, grita
outro. “Acho que eu não vou conseguir”, fala baixinho aquela moreninha tímida e
magricelinha, enquanto alguém arregala e esbugalha os olhos, tentando adivinhar
se é capaz.
Júlio,
até então, já foi repreendido mais de dez vezes: “senta direito”, “presta
atenção”, “abre o caderno”, “concentre-se”. Desisto...Deixo-o de lado.
Todos,
em silêncio, escrevem...
No
quadro, palavras relacionadas ao tema que eles trouxeram de dentro de suas
vivências brigam por espaço. Rimas (a gurizada adora) se cruzam e entrecruzam
no quadro verde, mas branco de giz. Tudo conspirando para ajudar a inspiração!
De vez em quando, um “ai,
professora” fica no ar.
E eu...observo.
Dali a pouco percebo
fisionomias transformando-se. Tensão virando alegria.
“Consegui, professora!”,
“olha aqui o meu poema!”.
Tudo consumado!
Poema estruturado!
A Poesia tomando conta da
aula, fluindo dos corações, aumentando a confiança e a autoestima, trazendo a
certeza de que é possível. É possível escrever com alegria e sem medo de errar.
“Eu sou o autor, né,
professora?”
- Agora, escrevam seus
Poemas na folha branquinha! Podem desenhar, colorir, fazer colagens, tudo para
enfeitar. Depois, é só prender no nosso “Varal de Poesias”. Parabéns, pessoal!
Está ficando lindo!
- Brenda, por gentileza,
vá buscar o fio!
A Poesia é linda!
E Júlio...? Onde está, o que está fazendo? Pensei em voz
alta, pois eu havia me distraído, envolta naquele clima de Poesia.
Nisso, ele levanta com sua
folha na mão.
- Está bom assim,
professora?
- Júlio, está ótimo,
parabéns! Pendure-o no Varal!
- Bá! Esqueci o prendedor,
professora!
Jussára C Godinho 30
junho 2007
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Meninos de rua
O
dia era frio, muito frio, chuvoso, nublado e escuro, a sensação era de que o
vento cortava, sangrando a pele. Poucas pessoas arriscavam sair às ruas. O mês
de junho, no extremo sul do país, maltrata alguns cidadãos.
Envolvida
em mantas de tricô, os famosos cachecóis, luvas e botas de couro legítimo, a
Madame pára seu carro importado no sinal vermelho. Surge a sua frente um menino
adolescente, quase moço, muito magro, corpo quase nu, coberto com tinta
prateada, mexendo seus malabares. Mal podia acreditar que alguém pudesse
suportar aquele frio em pelo. Misérias do mundo! A Madame tira da bolsa,
etiquetada com marca internacional, algumas moedas - que sobraram, talvez, do
cabeleireiro, da massagem, da manicure?- para pagar o show.
Na quadra seguinte, outro
sinal vermelho, fechado, gritando Pare, Olhe, Atenção! Outro menino, agora
criança, vendendo balas, no carro se encosta. Nas costas o peso de ser
diferente, carente, tão pequeninho, lutando sozinho, vendendo bala, cheirando
cola, sem escola, pedindo esmola. Mas quem dá bola para um vendedorzinho de
bala que só precisa de colo, de carinho, de uma boa escola, de um prato de
feijão e de um pouquinho de atenção?
Enquanto a Madame seguia
seu caminho sem olhar para trás, o menino seguia sua espera, espera, espera...
Jussára C Godinho 06 out 2006
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Feliz Ano Novo!
Mais um ano se passou. As
alegrias do início deste, em muitos dias, se repetiram. Em outros deram lugar a
tristezas. Em outros, ainda, a dores. Dores de aflições, de perdas, perdas
doloridas. A volta da alegria em momentos vitoriosos. Ou no aconchego do calor
de quem amamos. Do amor e da presença da família. Novamente preocupações, dias
corridos, noites maldormidas. Outra vez momentos felizes, lágrimas de emoção.
Satisfação plena. De novo um clima tenso, excesso de trabalho, cansaço. Ressentimentos,
desentendimentos, estresse. Correria, mil compromissos, burocracia. Sem tempo.
Cabeça doendo. E o tempo correndo...
Final de ano. Alegrias, encontros, reencontros. Festas, presentes.
Desejos de felicidades. Felicidades. Assim é a vida. E se assim não fosse, não
seria vida!
Jussára C Godinho
A cor da moda
“Tu já leu (sic) ‘variados tons de tal cor?” - era mais ou
menos isso o título do livro - foi a pergunta da colega - numa folguinha entre
aula e outra - acrescida do comentário “foi o mais vendido na Feira do Livro em
Caxias, no Brasil e no mundo”! A moça ficou com cara de “não entendi”, para não
dizer besteira, quando a minha resposta foi “não sei por que, mas sempre leio
os menos vendidos (risos)! Quase pude ver materializado no rosto o pensamento
dela, naquela expressão de quem diz: “é professora de Português, membro de
academia de letras, e não leu? É inadmissível”.
Até que gostaria de ter
lido, quanto mais se ler, melhor, a leitura nunca é demasiada e é bom que se
leia um pouco de tudo para conhecer e avaliar; e comentar, indicar, contraindicar,
mas (in)felizmente esses que, normalmente, são “os mais vendidos”, aqui e ali, vão parar sempre no fim da fila,
da enorme fila de leituras e releituras que me espera – precisaria, quem sabe,
de umas três ou quatro vidas para dar
conta de tudo.
Confesso que a empolgação da
colega professora, dizendo que fulana e sicrana estavam lendo, e estavam
adorando, e que estavam fazendo até uns comentários maliciosamente “quentes”
sobre a história, me deixou apreensiva, com a nítida sensação de estar perdendo
alguma preciosidade, ou de estar meio fora de moda, ou algo assim, não sei bem.
A primeira coisa que fiz, ao
chegar a minha casa, foi correr para o amigo Google e pedir socorro, afinal, ele resume e conta tudo a todo mundo,
resolve casos urgentes de alunos, desde o fundamental ao universitário, por que
não haveria de me ajudar num caso tão conflitante e urgente?
Pronto! Em segundos... Tudo
ali! Estampada na telinha a síntese e
comentários da famigerada história! No mais alto estilo das sagas adolescentes,
entremeada a cenas eróticas picantes. Uma saga (para os da minha geração, uma
Júlia, Sabrina) que virou gente grande, mas se esqueceu de amadurecer.
Ler ou não ler, colocar ou
não na fila, cometer o sacrilégio de criticar sem ler, sendo guiada pelas
experiências de leituras? Eis as questões!
Em meio a tantos tons de
tantas cores apresentados pelas editoras, chegando até as livrarias e
revolucionando as feiras de livros de todos os lugares, estão perdidos,
esquecidos e abandonados aqueles que colorem o espírito, fazem-no brilhar,
sobressair-se, crescer e aparecer. Na maioria das vezes, no fundo dos balaios
de promoção barata. Lamento que esses sejam sempre os menos procurados, menos
falados, menos vendidos... Os menos conhecidos, os nunca lidos.
Precisamos, sim, dar um
colorido as nossas vidas, ele é necessário, imprescindível, mas... Fiquemos em alerta!
Procuremos, escolhamos e adotemos os tons certos, a fim de dar um colorido
especial na grandiosa, magnífica tela do
imaginário, do conhecimento!
Elejamos as cores de um
arco-íris de luz que ilumine e expanda nossos horizontes. Quem sabe o tom Rosa de Guimarães, os tons secos
do Nordeste de Graciliano, o tom de ressaca dos olhos de Capitu, os tons
históricos de Euclides da Cunha em seu passeio literário pelos “sertões”, os
vários tons dos heterônimos de Pessoa, os tons macabros de Poe, os tons Quixoteanos
de Cervantes, os tons solitários de Gabriel García Márquez, enfim...
Decididamente, “50 tons de
qualquer coisa” não vai para o fim da minha fila de espera, aliás, não vai para
a fila! Pronto, falei!
Jussára C Godinho
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